Augusto dos Anjos - 161 - Lirial





Augusto dos Anjos - 161 - Lirial


Porque choras assim, tristonho lírio,

Se eu sou o orvalho eterno que te chora,

P’ra que pendes o cálice que enflora

Teu seio branco do palor do círio?!


Baixa a mim, irmã pálida da Aurora,

Estrela esmaecida do Martírio;

Envolto da tristeza no delírio,

Deixa beijar-se a face que descora!


Fosses antes a rosa purpurina

E eu beijaria a pétala divina

Da rosa onde não pousa a desventura.


Ai! que ao menos talvez na vida escassa

Não chorasses à sombra da desgraça,

Para eu sorrir à sombra da ventura!


Augusto dos ANJOS (1884 - 1914) - Eu e Outras Poesias.


Augusto dos Anjos é um dos mais originais poetas brasileiros, e também um dos mais populares. Sua obra consiste, porém, em apenas um livro. Eu foi publicado ainda em vida do autor; outros poemas, publicados em periódicos ou inéditos, foram coligidos após sua morte e acrescentados ao volume organizado pelo autor, renomeado então Eu e Outras Poesias . Aclamada pelo público e pela crítica, sua obra foi repudiada por muitos em sua época, e ainda causa estranheza, pela mistura de vocabulário coloquial e científico, pelos temas exacerbadamente macabros e pessimistas, pelo exagero sistemáticos na linguagem e no tratamento dos temas. Não obstante as controvérsias que cercam sua obra, muitos de seus versos caíram no uso popular, tais como um urubu pousou em minha sorte , a mão que afaga é a mesma que apedreja e outros.




 Augusto dos Anjos - 161 - Lirial