Eu sei que há muito pranto na existência,
Dores que ferem corações de pedra,
E onde a vida borbulha e o sangue medra,
Aí existe a mágua em sua essência.
No delírio, porém, da febre ardente
Da ventura fugaz e transitória
O peito rompe a capa tormentória
Para sorrindo palpitar contente.
Assim a turba inconsciente passa,
Muitos que esgotam do prazer a taça
Sentem no peito a dor indefinida.
E entre a mágoa que a másc’ra eterna apouca
A Humanidade ri-se e ri-se louca
No carnaval intérmino da vida.
Augusto dos Anjos é um dos mais originais poetas brasileiros, e também um dos mais populares. Sua obra consiste, porém, em apenas um livro. Eu foi publicado ainda em vida do autor; outros poemas, publicados em periódicos ou inéditos, foram coligidos após sua morte e acrescentados ao volume organizado pelo autor, renomeado então Eu e Outras Poesias . Aclamada pelo público e pela crítica, sua obra foi repudiada por muitos em sua época, e ainda causa estranheza, pela mistura de vocabulário coloquial e científico, pelos temas exacerbadamente macabros e pessimistas, pelo exagero sistemáticos na linguagem e no tratamento dos temas. Não obstante as controvérsias que cercam sua obra, muitos de seus versos caíram no uso popular, tais como um urubu pousou em minha sorte , a mão que afaga é a mesma que apedreja e outros.
By Sanderlei Silveira
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