Augusto dos Anjos - 064 - A um gérmen





Augusto dos Anjos - 064 - A um gérmen


Começaste a existir, geléia crua,

E hás de crescer, no teu silêncio, tanto

Que, é natural, ainda algum dia, o pranto

Das tuas concreções plásmicas flua!


A água, em conjugação com a terra nua,

Vence o granito, deprimindo-o... O espanto

Convulsiona os espíritos, e, entanto,

Teu desenvolvimento contunua!


Antes, geléia humana, não progridas

E em retrogradações indefinidas,

Volvas à antiga inexistência calma!...


Antes o Nada, oh! gérmen, que ainda haveres

De atingir, como o gémen de outros seres,

Ao supremo infortúnio de ser alma!


Augusto dos ANJOS (1884 - 1914) - Eu e Outras Poesias.


Augusto dos Anjos é um dos mais originais poetas brasileiros, e também um dos mais populares. Sua obra consiste, porém, em apenas um livro. Eu foi publicado ainda em vida do autor; outros poemas, publicados em periódicos ou inéditos, foram coligidos após sua morte e acrescentados ao volume organizado pelo autor, renomeado então Eu e Outras Poesias . Aclamada pelo público e pela crítica, sua obra foi repudiada por muitos em sua época, e ainda causa estranheza, pela mistura de vocabulário coloquial e científico, pelos temas exacerbadamente macabros e pessimistas, pelo exagero sistemáticos na linguagem e no tratamento dos temas. Não obstante as controvérsias que cercam sua obra, muitos de seus versos caíram no uso popular, tais como um urubu pousou em minha sorte , a mão que afaga é a mesma que apedreja e outros.




 Augusto dos Anjos - 064 - A um gérmen