Augusto dos Anjos - 020 - O caixão fantástico





Augusto dos Anjos - 020 - O caixão fantástico


Célere ia o caixão, e, nele, inclusas,

Cinzas, caixas cranianas, cartilagens

Oriundas, como os sonhos dos selvagens,

De aberratórias abstrações abstrusas!


Nesse caixão iam talvez as Musas,

Talvez meu Pai! Hoffmânnicas visagens

Enchiam meu encéfalo de imagens

As mais contraditórias e confusas!


A energia monística do Mundo,

À meia-noite, penetrava fundo

No meu fenomenal cérebro cheio...


Era tarde! Fazia muito frio.

Na rua apenas o caixão sombrio

Ia continuando o seu passeio!


Augusto dos ANJOS (1884 - 1914) - Eu e Outras Poesias.


Augusto dos Anjos é um dos mais originais poetas brasileiros, e também um dos mais populares. Sua obra consiste, porém, em apenas um livro. Eu foi publicado ainda em vida do autor; outros poemas, publicados em periódicos ou inéditos, foram coligidos após sua morte e acrescentados ao volume organizado pelo autor, renomeado então Eu e Outras Poesias . Aclamada pelo público e pela crítica, sua obra foi repudiada por muitos em sua época, e ainda causa estranheza, pela mistura de vocabulário coloquial e científico, pelos temas exacerbadamente macabros e pessimistas, pelo exagero sistemáticos na linguagem e no tratamento dos temas. Não obstante as controvérsias que cercam sua obra, muitos de seus versos caíram no uso popular, tais como um urubu pousou em minha sorte , a mão que afaga é a mesma que apedreja e outros.




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