Augusto dos Anjos - 039 - Depois da orgia





Augusto dos Anjos - 039 - Depois da orgia


O prazer que na orgia a hetaira goza

Produz no meu sensorium de bacante

O efeito de uma túnica brilhante

Cobrindo ampla apostema escrofulosa!


Troveja! E anelo ter, sôfrega e ansiosa,

O sistema nervoso de um gigante

Para sofrer na minha carne estuante

A dor da força cósmica furiosa.


Apraz-me, enfim, despindo a última alfaia

Que ao comércio dos homens me traz presa,

Livre deste cadeado de peçonha,


Semelhante a um cachorro de atalaia

Às decomposições da Natureza,

Ficar latindo minha dor medonha!


Augusto dos ANJOS (1884 - 1914) - Eu e Outras Poesias.


Augusto dos Anjos é um dos mais originais poetas brasileiros, e também um dos mais populares. Sua obra consiste, porém, em apenas um livro. Eu foi publicado ainda em vida do autor; outros poemas, publicados em periódicos ou inéditos, foram coligidos após sua morte e acrescentados ao volume organizado pelo autor, renomeado então Eu e Outras Poesias . Aclamada pelo público e pela crítica, sua obra foi repudiada por muitos em sua época, e ainda causa estranheza, pela mistura de vocabulário coloquial e científico, pelos temas exacerbadamente macabros e pessimistas, pelo exagero sistemáticos na linguagem e no tratamento dos temas. Não obstante as controvérsias que cercam sua obra, muitos de seus versos caíram no uso popular, tais como um urubu pousou em minha sorte , a mão que afaga é a mesma que apedreja e outros.




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